Páginas

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Missão Permanente, testemunhas alegres de Cristo

Dom Orani João Tempesta

Missão Permanente, testemunhas alegres de Cristo

Cardeal Orani João TempestaArcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ)

O Tempo Comum que vai do Natal à Quaresma é relativamente curto, mas nos coloca diante do início da vida pública de Jesus e a apresentação de sua missão. Essa missão, que hoje é continuada na Igreja, nos desafia no tempo atual com suas dificuldades e sonhos. Por isso, a cada dia desse tempo somos interpelados. Qual o sentido da vida diante da dor, do sofrimento, e o que anunciar ao mundo de hoje?

O livro de Jó, na primeira leitura deste Quinto Domingo do Tempo Comum, de modo dramático, mostra a vida humana: “Não é acaso uma luta a vida do homem sobre a Terra? Seus dias não são como dias de um mercenário”? E continua: “tive por ganho meses de decepção, e couberam-me noites de sofrimentos. Se me deito, penso: quando poderei levantar-me? E, ao amanhecer, espero novamente a tarde... Meus dias correm mais rápido do que a lançadeira do tear e se consomem sem esperança. Lembra-te de que minha vida é apenas um sopro e meus olhos não voltarão a ver a felicidade”.
Parecem palavras negativas, desesperadas estas de Jó, porém, na realidade, são uma reflexão realista sobre o mistério da vida humana, uma reflexão cheia de esperança, porque feita à luz de Deus. Uma coisa é pensar nas realidades negativas de nossa existência simplesmente contando com nossas forças. Que desespero, que desilusão, que vazio de sentido! Outra, bem diferente, é encarar a vida também com suas trevas, à luz de Deus, o amor eterno e onipotente! Que esperança que não decepciona, que paz que invade o coração, mesmo na dor!
Neste tempo em que se cultua o corpo, o físico sarado, a saúde e o vigor físico, e se presta tão pouca atenção ao sofrimento, à dor, ao fracasso... Neste mundo que tem medo de pensar na morte e de assumir que todos morreremos, que não sabe o que fazer com o sofrimento, com a doença, com a decadência física, com a deformidade do corpo, estas palavras de Jó convidam-nos a colocar os pés no chão. Por isso, não são palavras pessimistas porque aquele que chora e busca o sentido da existência, fá-lo diante de Deus. A leitura conclui em forma de oração: “Lembra-te de que minha vida é apenas um sopro e meus olhos não voltarão a ver a felicidade”. O triste na vida não é sofrer, não é chorar, não é morrer... Triste e miserável é sofrer e chorar e morrer sem Deus, que dá sentido à nossa existência.
A resposta plena, porém, vem no Evangelho (Mc 1, 29-39), onde apresenta Jesus rodeado de uma multidão marcada pelo sofrimento: “Curou muitos enfermos atormentados por diversos males e expulsou muitos demônios” (Mc 1, 34). Mas se, por um lado, Ele se dedica a curar, por outro se retira para um lugar deserto. E ali orava durante a noite. Ação apostólica e oração se completam. Pedro e seus companheiros O procuram. Quando O encontram, dizem-lhe: “Todos te procuram”. A verdadeira luz deve ser procurada em Deus, sobretudo através da oração.
Quando os apóstolos disseram: “Todos andam à Tua procura”; o Senhor respondeu-lhes: “Vamos a outros lugares, às aldeias da redondeza! Devo pregar também ali, pois foi para isso que eu vim” (Mc 1, 38). A missão de Cristo é evangelizar, levar a Boa Nova até o último recanto da Terra através dos Apóstolos e dos cristãos de todos os tempos. Esta é a missão da Igreja, que assim cumpre o que o Senhor lhe ordenou: “Ide e pregai a todos os povos…, ensinando-os a observar tudo quanto vos mandei” (Mt 28, 19-20).
Os Atos dos Apóstolos narram muitos pormenores da primeira evangelização; no próprio dia de Pentecostes, São Pedro prega a divindade de Jesus Cristo, a sua Morte redentora e a sua Ressurreição gloriosa. São Paulo, citando o profeta Isaías, exclama com entusiasmo: “Como são formosos os pés dos que anunciam a Boa Nova”! E a segunda leitura da Missa fala-nos da responsabilidade deste anúncio alegre da verdade salvadora: “Porque evangelizar não é glória para mim, mas necessidade. Ai de mim se não evangelizar”.
Com estas mesmas palavras de São Paulo, a Igreja tem recordado, com frequência aos fiéis, o chamado que o Senhor lhes dirige para levarem a doutrina de Cristo a todos os cantos do mundo, aproveitando qualquer ocasião. A dedicação à tarefa apostólica nasce da convicção de se possuir a Verdade e o Amor, a verdade salvadora e o único amor que preenche as ânsias do coração. Quando se perde essa certeza, não se encontra sentido na difusão da fé. Chega-se a pensar, por exemplo, mesmo em ambientes cristãos, que não se pode fazer nada para que apoiem uma lei reta, de acordo com o querer divino. Deixa também de ter sentido levar a doutrina de Cristo a regiões onde ela ainda não chegou, ou onde a fé não está profundamente arraigada; quanto muito, a missão apostólica converte-se numa mera ação social em favor da promoção desses povos, esquecendo o maior tesouro que lhes pode dar: a fé em Jesus Cristo, a vida da graça.
No próximo dia 11, na celebração de Nossa Senhora de Lourdes, iremos comemorar o Dia do Enfermo. Ver a vida em toda a sua realidade à luz da fé faz a diferença. E com a Palavra de hoje, somos chamados a ser testemunhas alegres de Cristo, anunciando a boa notícia a este mundo que procura, “às apalpadelas”, o sentido da vida diante de tantas situações pelas quais passa no dia a dia.
Eis a nossa missão a que hoje o Evangelho nos chama, e que tanto o Papa Francisco tem insistido: uma igreja em saída, samaritana, próxima que testemunha a “alegria do evangelho”.