O Dia de Corpus Christi festeja a presença
real de Jesus Cristo na hóstia consagrada (o sacramento da Eucaristia), o que
Ele instituiu na quinta-feira Santa, durante a Última Ceia com os 12 Apóstolos.
A comemoração do fato ganhou esta segunda festa – pois também é celebrado na
própria quinta-feira Santa – em razão de a primeira data acontecer em tempo de
penitência, véspera da memória da Paixão e Morte de Cristo, o que não dá margem
a expressões muito alegres. O dia de Corpus Christi é uma festa móvel (a cada
ano tem uma data diferente) e cai sempre na primeira quinta-feira após o
Domingo da Santíssima Trindade.
Jesus
havia permanecido três anos com seus Apóstolos e chegara a hora de voltar ao
Pai que o enviara. Ia desaparecer visivelmente dos olhos de seus amigos. Como
fazer para ficar sempre presente com eles e seus seguidores? Ele ia dar sua
maior prova de amor na cruz, para salvar a humanidade, mas de que forma
perpetuar gesto de amor tão profundo? Instituiu, então, o sacrifício
Eucarístico de seu corpo e sangue, e o confiou à sua Igreja. A presença dele
neste sacramento não é um sinal apenas: é a presença real do próprio Cristo, no
pão e vinho transubstanciados.
A
origem da celebração
Conta
a tradição que esta festa originou-se na Bélgica, no século XIII, quando a Irmã
Juliana de Cornillon (que depois viria a ser beatificada) teria tido visões de
Jesus Cristo, o qual demonstrou-lhe o desejo de que o mistério da Eucaristia
fosse celebrado com destaque. Em 1264, o Papa Urbano IV estendeu a festividade
para toda a Igreja, pedindo a São Tomás de Aquino que preparasse as leituras e
textos litúrgicos, até hoje utilizados durante a celebração.
A
vidente
Juliana
de Liege era monja e viveu entre os anos 1192 e 1258. Nasceu em Retinne,
próximo de Liege, província belga. Aos 5 anos tornou-se órfã, passando a ser
criada no Mosteiro de Monte Cornillon. Ela estava decidida a fazer os votos de
uma vida totalmente entregue a Deus e vestiu o hábito das monjas agostinianas
neste mesmo mosteiro, em 1207.
Suas
virtudes e dons se evidenciavam e passou a descrever suas revelações, obtidas
durante suas orações contemplativas. Em uma delas, Juliana descreveu uma lua
atravessada por uma faixa escura. Segundo sua interpretação, esta lua
incompleta significava a liturgia que, embora em seu esplendor, lhe faltava uma
festa em honra do Corpo Sagrado de Cristo, sacrificado pela humanidade.
Confidenciava as revelações apenas à Irmã Eva e a uma enfermeira, Isabela. A
aliança e cumplicidade entre as três mulheres frutificaram na propagação desse
culto.
Mais
tarde, o bispo de Liege instituiu, embora com relutância, a festa tão desejada
pelas Irmãs e pela comunidade, dando-lhe o nome de Corpus Domini (“Corpo de
Deus”). Porém, muitos se mostraram contrários à festa e ao culto. O bispo
hesitava, mas Juliana já tinha preparado o ofício (a pregação), as leituras e
os cantos para a nova celebração. Seu texto acabou sendo lido, explicado e
cantado. Apaziguados os ânimos, o bispo decidiu instituir de vez, em 1246, a
festa diocesana do Corpus Domini.
Outro
acréscimo à história, conforme a tradição, é que um sacerdote chamado Pedro de
Praga tinha dúvidas sobre a real presença de Cristo na Eucaristia. Decidiu,
então, peregrinar ao túmulo dos Apóstolos Pedro e Paulo, em Roma, para pedir a
fé. Ao passar por Bolsena (Itália), enquanto celebrava a Missa, foi novamente
acometido da dúvida. Na hora da consagração (momento da transubstanciação da
hóstia e do vinho em corpo e sangue de Cristo) veio-lhe a resposta em forma de
milagre: a hóstia transformou-se em carne, respingando sangue e manchando as
toalhas litúrgicas do altar, mas sem molhar as mãos do padre, pois a parte que
estava com ele conservou-se como pão ázimo.
Um
dos religiosos que haviam apoiado Juliana em sua iniciativa foi Jacinto
Pantaleão, arquidiácono de Trois, que acabaria sendo eleito Papa em 1261,
adotando o nome de Urbano IV. Pois por solicitação dele, esses objetos
milagrosos foram para Orvieto em grande procissão, sendo recebidos solenemente
pelo próprio Papa e levados para a Catedral de Santa Prisca. Esta teria sido a
primeira procissão do Corpo Eucarístico. Em 11 de agosto de 1264, através da
bula papal Transiturus, Urbano IV instituiu a festividade do Corpus Domini
(“Corpo de Deus”) para toda a Igreja.
Infelizmente,
Juliana de Liege não viveu para ver este acontecimento. Tornara-se priora do
Mosteiro de Monte Cornillon, em 1230, trabalhando pela manutenção de uma
disciplina rigorosa, que não agradou a muita gente. Em 1248 ela decidiu deixar
o cargo e ingressou na clausura em Fosses, também na Bélgica, onde viveu até
morrer, a 5 de abril de 1258. Seu corpo foi sepultado na Abadia Cistercense de
Villers. Mas ela teve tempo de saber que a festa de Corpus Domini já era
comemorada em toda a Bélgica, França e Alemanha. O Papa Pio IX beatificou
Juliana de Liege em 1869 e confirmou seu culto litúrgico para o dia 6 de abril.
Arquidiocese
de Niterói
Publicado
no Veritas, edição 26 - Junho/2004