Não é suficiente reconhecer
a urgência de aplainar os caminhos. É preciso disposição ao assumir propósitos
que norteiem e reeduquem para o sentido de justiça e paz.
O tempo
do Advento, sábio e indispensável período de preparação, enriquece a celebração
do Natal, livrando-a das superficialidades. Importante oportunidade para o
aprimoramento humano e espiritual, faz ecoar este convite irrecusável:
“Aplainai os caminhos!”. A competência educativa e o conhecimento refinado de
política fazem do profeta Isaías porta-voz de uma indicação preciosa para
orientar os passos na superação dos mais difíceis desafios. Uma preciosidade
que reluz quando se consideram os cenários da sociedade contemporânea. O
convite para aplainar os caminhos é o remédio e a indispensável reação às
inúmeras crateras que se abrem na vida do povo, como consequência do absurdo
comprometimento do bem comum e das lamentáveis negociações da justiça.
Há rombos nas instituições, nas empresas, nas igrejas, nas famílias, nas
organizações, na política e também no fundo do coração das pessoas. Esse mapa
complexo revela tantas marcas nesses corações, que impedem o traçado de um
equilibrado percurso. A construção cotidiana da vida fica sempre aquém das
metas mínimas necessárias para a construção da paz, do grande bem que só se
alcança quando a cidadania e a vivência da fé são assumidas como compromissos
prioritários. E na contramão do grande sonho de se concretizar um projeto
humanitário de paz, as estatísticas revelam aumento da violência, situando a sociedade
brasileira entre as que vivem em pé de guerra, com incidências de mortes até
mais elevadas.
O convite
feito por Isaías – “Aplainai os caminhos!”– chega mais próximo
de todos na voz clamante do deserto, pela figura inigualável de João Batista,
na inauguração do tempo do Novo Testamento, quando o profeta anuncia a chegada
de Jesus Cristo, o Príncipe da Paz, Senhor e Salvador.
Assim,
este tempo precisa ser entendido como campanha para capacitar todos na missão
de “construtores” desta paz desafiada não só pelos quadros de violências fatais
e absurdas, como também pela busca desarvorada e mesquinha pelo dinheiro.
Conduta que envenena as relações pessoais e cidadãs com a corrupção, que
envergonha a nação como, lamentavelmente, desenha-se e emoldura-se o horizonte
da sociedade brasileira.
Contudo,
não é suficiente reconhecer a urgência de aplainar os caminhos. É preciso
disposição ao assumir propósitos que norteiem e reeduquem para o sentido de
justiça e paz. Proposta de vida que se constrói a partir de princípios
amplamente conhecidos, mas cada vez menos vividos e que, de modo pedagógico,
como fez nosso Deus, não nos custa recordar. Não é demais pautar um decálogo,
não como ordem, mas um convite ao trabalho na urgente tarefa de restabelecer a
paz entre nós:
1. Respeitar, pelo princípio da
igualdade, incondicionalmente, cada pessoa;
2. Preservar o ambiente para superação
de danos à convivência humana;
3. Lutar pelo respeito dos Direitos
Humanos;
4. Investir para que cada família seja
comunidade de paz;
5. Trabalhar e solidariamente
repartir, para que a ninguém falte o necessário;
6. Desmantelar os esquemas geradores de
conflitos, desde os desarmamentos até os litígios pessoais que comprometem o
coração da paz que cada pessoa deve ter;
7. Perdoar sempre, porque não há
justiça sem perdão nem paz sem amor;
8. Professar e testemunhar a fé como
compromisso de fomentar a solidariedade fraterna;
9. Gostar da verdade e por ela reger
diálogos e relacionamentos para ser obreiro da paz;
10. Preservar a criação pelo tratamento
civilizado dos seus bens, direito de todos.
E faço
aqui outro convite, desta vez, à reflexão: Você escreveria um decálogo
diferente? E qual seria a sua proposta? Indispensável é assumir propósitos que
possam nos levar ao amor e à paz, a uma experiência verdadeira de Natal,
atendendo ao pertinente convite deste tempo: “Aplanai os caminhos!”.
Dom Walmor Oliveira de
Azevedo
O Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte,
Dom Walmor Oliveira de Azevedo, é doutor em Teologia Bíblica pela Pontifícia
Universidade Gregoriana. Atual membro da Congregação para a Doutrina da Fé e da
Congregação para as Igrejas Orientais. No Brasil, é bispo referencial para os
fiéis católicos de Rito Oriental. http://www.arquidiocesebh.org.br
Acesso: 05/12/2019