Introdução
O dízimo carrega uma surpreendente alegria no contribuinte. Aqueles que se devotam a esta causa se sentem mais animados, confortados e motivados para viver a comunhão. O dízimo, certamente, não é uma questão de dinheiro contrariando o que muitos podem pensar. Ele só tem sentido quando nasce de uma proposta para se fazer a experiência de Deus na vida cristã. Somos chamados e convocados a este desafio.
Em caso contrario, ele se torna frio e distante; por vezes indiferente. A espiritualidade reequilibra os desafios que o dízimo carrega em si. "Honra o Senhor com tua riqueza. Com as primícias de teus rendimentos. Os teus celeiros se encherão de trigo. Teus lagares transbordarão de vinho" (Pr 3,9-10). Contribuir quando se tem de sobra, de certa forma, não é muito dispendioso e difícil. Participar da comunhão alinha o desafio do dízimo cristão.
Neste artigo não vamos tratar do dizimo em si. Se desejar ler, aceno: Gn 28, 20-22; Lv 27, 30-32; Nm 18, 25-26 e Ml 3, 6-10.
Apenas alguns indicativos. A nossa centralidade será sobre a sua espiritualidade.
1. O que é o dízimo?
Vamos menear apenas alguns elementos para se ter a idéia. Em hebraico, no Antigo Testamento, a palavra usada para indicar dízimo é maaser, que significa "décima parte". O grego usa a palavra dekate, que tem o mesmo significado. Normalmente se usa o verbo apodekato, ou seja "dar a décima parte". Alguns textos importantes, no Novo Testamento, são:
- Mateus 23,23: "Ai de vocês, doutores da Lei e fariseus hipócritas! Vocês pagam o dízimo da hortelã, da erva-doce e do cominho, e deixam de lado os ensinamentos mais importantes da Lei, como a justiça, a misericórdia e a fidelidade. Vocês deveriam praticar isso, sem deixar aquilo".
- Lucas 11,42: "Mas, ai de vocês, fariseus, porque vocês pagam o dízimo da hortelã, da arruda e de todas as outras ervas, mas deixam de lado a justiça e o amor de Deus. Vocês deveriam praticar isso, sem deixar de lado aquilo" (cfr. 18,12) e;
- Hebreus 7,5: "Segundo a lei de Moisés, os descendentes de Levi, que se tornam sacerdotes, devem cobrar o dízimo do povo, isto é, dos seus irmãos, embora estes também sejam descendentes de Abraão".
No Novo Testamento não existe um texto que fala do dízimo, de uma taxa dada à igreja. Os textos que nos referimos acima, em geral, falam sempre do costume hebraico de dar o dízimo aos levitas. Nos Atos dos Apóstolos se fala da solidariedade e da divisão dos bens entre os primeiros cristãos. Atos 2,42ss. contam como na primeira comunidade os cristãos tinham tudo em comum. O mesmo livro, em At 4, 36-37, conta como Barnabé vendeu o campo que possuía e colocou o dinheiro "aos pés dos apóstolos". Também no capítulo 5 diz como Ananias e Safira tentaram enganar a comunidade, escondendo o verdadeiro preço da propriedade vendida. De qualquer forma Pedro (Atos 5,3) diz que o pecado deles não consistiu no fato de não ter dado o dinheiro à comunidade, mas na mentira feita ao Espírito Santo. O que se pretendia? Colocar uma aureola de generosidade diante dos outros? Garantir privilégios para si próprios? "Qualquer cristão-leitor fica sabendo que Satanás pode penetrar numa comunidade como um dia penetrou num dos doze" (Pe. Luis A. Schokel).
2. O que são as coletas?
Certamente que são bem diferentes dos dízimos. As coletas são aquelas campanhas que fazemos por ocasião de uma determinada situação na igreja, na comunidade, enfim. Aqui podemos lembrar a coleta da Campanha da Fraternidade, do dia das missões, do Advento, afinal, por uma situação em que a Igreja esteja vivenciando, como por exemplo: enchentes, seca, catástrofes, terremoto etc. Toda coleta é uma ocasião de solidariedade com aqueles que estão sofrendo por alguns baques da natureza ou por questões sociais. Elas, de certa forma, são passageiras e ocasionais.
Não tem o caráter definitivo e constante. Aqui vale lembrar a coleta que o Apostolo Paulo fizera em favor do povo sofrido de Jerusalém: "Quanto à coleta em favor dos irmãos, façam como eu ordenei às igrejas da Galácia. Todo primeiro dia da semana, cada um coloque de lado aquilo que conseguiu economizar; desse modo, vocês não precisarão esperar que eu chegue para fazer a coleta. Quando eu chegar, mandarei com uma carta minha aqueles que vocês tiverem escolhido para levar suas ofertas a Jerusalém. Se for conveniente que eu mesmo vá, eles farão a viagem comigo" (1Cor 16, 1-4).
3. O que são as ofertas?
As ofertas, todavia, recorda aquele gesto que fazemos durante a celebração da Santa Missa. Evoca a lembrança de se levar à mesa do altar aquilo que os irmãos da comunidade trouxeram para celebrar. Expressa uma atitude de agradecimento e de ação de graças. Agrada a Deus quando as pessoas dão ofertas. A Bíblia diz em Êxodo 35, 22: "Chegaram homens e mulheres, e entregaram generosamente fivelas, pingentes, anéis, pulseiras e todo tipo de objetos de ouro, e cada um os oferecia ritualmente diante de Javé". Agrada a Deus quando damos generosamente.
A Bíblia diz em Esdras 2, 68-69: "Vários chefes de família, ao chegarem ao Templo de Javé, que está em Jerusalém, fizeram suas ofertas espontâneas, para que o Templo fosse reconstruído no mesmo lugar. Conforme cada um podia, deram para o tesouro do culto sessenta e uma mil dracmas de ouro, cinco mil minas de prata e cem túnicas sacerdotais". Agrada a Deus quando nos "sacrificamos" para dar ofertas regularmente. A Bíblia diz em 2 Coríntios 8, 2: "Em meio às muitas tribulações que puseram à prova essas igrejas, a grande alegria e a extrema pobreza delas transbordaram em riquezas de generosidade".
Para ser generoso é preciso preparar e planejar. A Bíblia diz em Levítico 19, 9-10: "Quando vocês fizerem a colheita da lavoura nos seus terrenos, não colham até o limite do campo; não voltem para colher o trigo que ficou para trás, nem as uvas que ficaram no pé; também não recolham as uvas caídas no chão: deixem tudo isso para o pobre e o imigrante. Eu sou Javé, o Deus de vocês".
Outras considerações: dar ofertas pode ser um ato de adoração (Mateus 2, 11); As ofertas devem ser dadas de boa vontade (2 Coríntios 9, 7); Cada pessoa deve dar o quanto possa (2 Coríntios 8, 12); Deus requer muito daqueles que recebem muito (Lucas 12, 48). Dar os dízimos e as ofertas garante as bênçãos de Deus. A Bíblia diz em Malaquias 3, 8 - 10: "Pode um homem enganar a Deus?» Pois vocês me enganaram! Vocês perguntam: «Em que te enganamos?» No dízimo e na contribuição. Vocês estão ameaçados de maldição, e mesmo assim estão me enganando, vocês e a nação inteira! Tragam o dízimo completo para o cofre do Templo, para que haja alimento em meu Templo. Façam essa experiência comigo - diz Javé dos exércitos. Vocês hão de ver, então, se não abro as comportas do céu, se não derramo sobre vocês as minhas bênçãos de fartura".
A generosidade regressa ao doador. A Bíblia diz em Lucas 6, 38: "Dêem, e será dado a vocês; colocarão nos braços de vocês uma boa medida, calcada, sacudida, transbordante. Porque a mesma medida que vocês usarem para os outros, será usada para vocês". Deus é o melhor exemplo de generosidade (João 3, 16) (cfr. bíbleinfo).
4. Por onde passa a espiritualidade do dízimo?
A opção pelo dízimo caminha na trilha da generosidade e seus derivados, tais como: beleza, bondade, liberalidade, munificência, grandeza de alma etc. Dizimar é um gesto de dar, doação; é uma subida da alma ate Deus para contemplar a sua criação que necessita do resgate da beleza, da abertura do coração, da partilha de um gesto generoso. Contribuir com o dízimo é um incentivo à generosidade; é a mão estendida do novo ser renovado na solidariedade! Diz o dicionário: "Generosidade é a virtude em que a pessoa tem quando acrescenta algo ao próximo. Generosidade se aplica também quando a pessoa que dá algo a alguém tem o suficiente para dividir.
Não se limita apenas em bens materiais. Generosos são tanto as pessoas que se sentem bem em dividir um tesouro com mais pessoas porque isso as fará bem, tanto quanto aquela pessoa que dividirá um tempo agradável para outros sem a necessidade de receber algo em troca" (wikipédia).
As considerações espirituais de Santo Agostinho são coloridas por comparações e exemplos que remetem a essa realidade quotidiana. Por exemplo, após exortar ao desprendimento em relação aos bens materiais e criticar contundentemente os avarentos, Agostinho propõe a generosidade, valendo-se da comparação mais familiar a seus ouvintes: "Que havemos de fazer pois, com as nossas riquezas? "Sede ricos em boas obras, dadivosos, generosos" (1Tm 6,18) ... Deus não quer que percas as tuas riquezas, mas te aconselha a mudá-las de lugar. Que vossa caridade me entenda: suponhamos que não sejas bom conhecedor do trigo e que entrasse em tua casa um amigo perito na conservação desse cereal e visse que o armazenas no chão úmido e te desse um conselho: "Irmão, estás a perder o que com grande esforço colheste, pois se o deixas em lugar úmido, em poucos dias estará podre" "Que devo fazer, irmão?" "Sobe-o para o andar de cima". Tu que ouves um amigo que sugere a elevação do trigo, não ouves a Cristo que te aconselha a elevares teu tesouro da terra para o céu não já para conservar o que guardas, mas para sublimar: guardavas terra e receberás céu; guardavas o extinguível, receberás imortalidade" (En. 48,1,9).
5. Educar o coração para a doação
No mundo marcado pelo capitalismo selvagem, pelo massacrante egoísmo alguém deve fazer a diferença. Em tempo de tanta penúria, sofrimento, injustiça alguém deve dar o primeiro passo com o intuito de ser distinto. Doação é o ato de dar um bem próprio a outra pessoa, geralmente alguém necessitado, ou a uma instituição. O coração, no entanto, deve estar atento e educado para isso. O dízimo somente faz sentido para aquele que aprende a educar seu coração para a generosidade conseqüente. A espiritualidade passa por esse difícil caminho de ascensão. Paulo lembra: "cada um dê conforme decidir em seu coração" (2 Cor 9,7a) e acrescenta: "sem pena e constrangimento, porque Deus ama quem dá com alegria" (v. 7b).
A partilha e a solidariedade em favor dos mais pobres não se manifestavam só na própria comunidade, mas eram sinal de unidade entre as diversas comunidades. A solidariedade com o dízimo é sinal de um sadio intercambio material e não somente uma questão periférica da fé. A espiritualidade do dízimo é um sinal de obediência à Palavra de Deus, presente em seu Evangelho. "Tal serviço será para eles uma prova; e eles agradecerão a Deus pela obediência que vocês professam ao Evangelho de Cristo e pela generosidade com que vocês repartem os bens com eles e com todos" (2 Cor 9, 13).
6. Conclusão
Tivemos pouco espaço para falar sobre a espiritualidade do dizimo. Talvez algum dia (mais) aprofundaremos a matéria. Existem tantas opções de sugestões para falar sobre essa maravilhosa experiência de Deus na vida cristã. Resumidamente podemos concluir com alguns acenos. Uma pergunta: o que é e o que significa ser dizimista? Ser dizimista é:
- estar aberto ao infinito. Deus nos dá tudo que temos e possuímos;
- colaborar na expansão do Reino de Deus. O dízimo nos faz crescer em direção ao céu e a terra em perfeita harmonia;
- agradecer a Deus sua bondade. Uma oportunidade única nessa vida de concidadãos do céu. Eternamente agradecidos pelo dom da vida;
- expressar a fé. Oportunidade de crescer em função dos irmãos. A solidariedade nasce da partilha entre os irmãos. Um gesto que dá sentido à vida;
- devolver a Deus o que é de Sua propriedade (Lv 27, 30). Por toda bondade reconhecida eu me disponho todo mês fazer fielmente a minha parte. Somos um povo consagrado ao Senhor e reconhecemos isso como filhos obedientes;
- ter consciência eclesial. Sou convidado a contribuir na expansão do Reino de Deus. O Reino é como uma semente lançada ao solo do coração generoso. Sempre dará frutos. A realidade de nosso povo nos interpela (DA, 12ss. "Fazer da Igreja a casa e a escola de comunhão: eis o grande desafio que nos espera" (nº. 54)) e - amar a Deus e ao próximo. Síntese de toda a bondade humana e reconhecimento da imensa generosidade do Pai que nos deu seu Filho como Salvador.
Fonte : Pe. Jerônimo Gasques