No Blog passado expus a íntima união entre o Catecismo da Igreja
Católica e o Diretório Geral para a Catequese, como
também apontei para outros três textos que poderíamos chamar de satélite do
grande Catecismo. São eles: o Compêndio do Catecismo da
Igreja Católica (texto oficial da Sé Apostólica), o opúsculo Sou
Católico: vivo a minha fé, (de autoria da Comissão de Doutrina da CNBB) e o YouCat,
chamado também Catecismo Jovem da Igreja Católica (produzido
na Alemanha e Áustria). Sobre os dois últimos, falaremos no próximo blog.
Vamos nos deter hoje sobre o Compêndio do Catecismo da Igreja
Católica. Falamos já de sua origem e redação. Agora, entremos um pouco mais
no mérito de seu conteúdo.
Há vários gêneros de catecismos, particularmente os de caráter mais bíblico narrativo:
apresentação do anúncio da mensagem bíblica; ou de caráter mais doutrinal:
apresentação da doutrina essencial da fé, de maneira ordenada ou sistemática e
de fácil compreensão. Na história da Igreja os catecismos doutrinais têm sido
os mais frequentes. O Compêndio é um texto nítidamente
doutrinal.
Com relação aos conteúdos, os catecismos podem ser também uma
apresentação simples dos dados essenciais da fé (o que crer, o que fazer,
o que evitar, como rezar...), mas também podem ser
concebidos como um compêndio dogmático, com linguagem às vezes
difícil que provém mais da teologia do que da bíblia ou liturgia,
transformando-se assim em manuais mais ou menos completos da doutrina cristã. O
Compêndio tem também um caráter dogmático-moral, mas, em apêndice, traz também
belas páginas com as orações mais comuns da nossa tradição ocidental e da
orienta.
Uma outra característica do catecismo tradicional é o seu estilo
dialógico em perguntas e respostas, que alguns acham que é um estilo
ultrapassado. Mas, fazer boas perguntas e dar respostas satisfatórias é um ótimo
método de ensino-aprendizagem. O problema é qual pergunta e qual resposta. As
perguntas, nos catecismos tradicionais, e também neste Compêndio,
em geral brotam não das necessidades ou da experiência do catequizando, mas da
necessidade de se apresentar os conhecimentos em torno da fé de uma maneira
ordenada e sistemática. Daí o seu caráter tambémdedutivo e não indutivo.
O Compêndio resumo toda a doutrina cristã em quase 600
perguntas, com respostas em geral breves.
Como já dissemos, desde Lutero impôs-se o costume de se apresentar
sempre dois textos: ocatechismus minor (catecismo menor: ou, como
chamou Lutero, das klein catechismus), destinado aos principiantes;
e o catechismus maior (catecismo maior ou das gross
catechismus), mais para os adiantados.
O Compêndio do Catecismo da Igreja Católica é
claramente um “catecismo menor”, com relação ao “Catecismo Maior” (Catecismo
da Igreja Católica). Bento XVI, em sua carta de aprovação, diz
textualmente: “o Compêndio é uma síntese fiel e segura do Catecismo
da Igreja Católica [...] Ele espelha fielmente, na estrutura, nos
conteúdos e na linguagem, o Catecismo da Igreja Católica, que encontrará nesta
síntese uma ajuda e um estímulo para ser mais conhecido e aprofundado”.
Quanto ao conteúdo, continua dizendo o Papa: “o Compêndio contém,
de forma concisa, todos os elementos essenciais e fundamentais da fé da Igreja,
constituindo uma espécie de vademecum [quase que um guia
do usuário], que dá a possibilidade às pessoas, crentes e
não-crentes, de abarcarem numa visão de conjunto o panorama inteiro da fé
católica” (cf. Motu Próprio para a aprovação e a publicação).
Para aprovar o Catecismo da Igreja Católica João Paulo
II havia usado um estilo de máxima autoridade e muito solene, ou seja uma Constituição
Apostólica. No caso do Compêndio o tipo de documento usado
para a aprovação foi mais modesto: um simples motu proprio.
Tanto sua Introdução como o motu próprio que
o aprova, falam de uma fidelidade quase que literal deste Compêndio ao Catecismo
da Igreja Católica. Entretanto pode-se notar algumas diferenças. Por
exemplo: a referência à restrição da “pena de morte” está muito mais acentuada
no Compêndio (nº 469) do que no Catecismo (nº
2267); a omissão da expressão “guerra justa” no nº 484, admitindo-a sim, porém
com mais restrições nos números 483-486, do que nos longos números 2304 – 2317
doCatecismo original. Também quando se fala dos pecados
contra a castidade acrescenta-se, com palavras muito severas, em dois
lugares, a condenação à pedofilia (embora este vocábulo não apareça: cfr nºs
492 e 494; e no Catecismo da Igreja Católica: nºs 2351-2353).
A catequese, nesses últimos cinquenta anos tem orientado a pedagogia da
fé muito mais para aexperiência de Deus, o contato direto com as Sagradas
Escrituras, a dimensão litúrgico-celebrativa e a participação
e vivência na comunidade de fé, do que o aprendizado da doutrina. O conteúdo
doutrinal é sim um elemento importante, porém não o mais urgente e
necessário, particularmente nos primeiros passos na educação da fé. Ele adquire
importância nos estágios mais avançados da caminhada da fé, quando, cada vez
mais é necessário “dar razões da própria fé”.
Daí a importância de acolher este Compêndio dentro de
seu justo lugar. Será um ótimo instrumento para a catequese se estiver a
serviço da dimensão doutrinal ou racional da fé dentro do quadro maior
do complexo processo da educação da fé, que implica muito mais o
envolvimento experiencial das pessoas do que a transmissão doutrinal.
Num clima de cristandade, onde a dimensão da iniciação à fé era
feita na família ou mesmo na sociedade (o chamado catecumenato social,
pois tudo na família ou na sociedade levava a pessoa à experiência da fé) a
catequese quase que podia se reduzir a “organizar os conhecimentos” ou
“apresentar sistematicamente a doutrina que dava suporte a esta
experiência”.
Entretanto, o mundo mudou e não vivemos mais em clima de cristandade.
Hoje as pessoas necessitam mais de evangelização do que propriamente de
catequese doutrinal, ou, como diz muito bem o Diretório Nacional de
Catequese, de uma catequese evangelizadora, centrada mais na
experiência da fé, no contato pessoal com Jesus Cristo, do que no aprendizado
da doutrina. Esta terá a função insubstituível de dar fundamento, solidificar,
estruturar aquela experiência primordial. E neste sentido, o Compêndio
do Catecismo da Igreja Católica é muito bem vindo!
Um conselho: quem for usar o Compêndio tenha sempre diante de si o
grande Catecismo, que trata as questões de um modo mais
vivencial. Na verdade Compêndio extraiu do grande Catecismo quase
que só aquilo que ele tem de doutrinal, que em geral está ligado
mais ao Concílio de Trento; ao passo que o grande Catecismo se
estende mais pelo pensamento e modo de falar do Concílio Vaticano II.
Pe. Luiz Alves de
Lima, sdb, é doutor em Teologia Pastoral, catequeta, professor de teologia,
conferencistas, redator e editor da Revista de Catequese.