Batizar
uma pessoa ainda quando pequenina lhe tira a liberdade perante a
prática religiosa?
Por
que é melhor para batizar uma criança ainda bebê? Não é melhor
que ela mesma "escolha" quando crescer? (Pergunta via
FB)
A
questão é importante, porque se trata de uma crítica que é
bastante difundida. A resposta aborda dois aspectos, um
antropológico, ou seja, sobre quem e como é o ser humano; e outro
especificamente cristão.
Sobre
o primeiro, hoje em dia é comum encontrar uma visão fortemente
individualista do homem, cujo ideal é o homem autônomo, que faz e
decide tudo sozinho. Isso tem consequências na educação,
pois se busca não incutir uma moral, e nem mesmo o sentido das
coisas. O construtivismo, como é chamada essa tendência na
educação, pretende limitar-se a fornecer informações para que a
criança dê um sentido próprio ao que vê, e vá selecionando as
suas próprias convicções, inclusive éticas. Cada um faria o seu
próprio sistema de valores. Pode parecer uma teoria atraente, mas na
realidade é insustentável. Os seres humanos precisam aprender, e
não apenas uma informação "bruta", mas o sentido que as
coisas têm. E precisam aprender a se comportar, não apenas na
teoria. Portanto, precisam ser educados. Pela própria natureza, os
primeiros e principais responsáveis pela educação são os pais. E
nenhum pai vai até a criança e lhe diz para parar de responder
"obrigado" quando lhe dão algo, argumentando que a
gratidão é um valor ético que ela deverá escolher para si quando
for mais velha.
Não
se espera que se torne adulto para incutir essas virtudes,
simplesmente porque não se pode esperar. Seguindo o exemplo
anterior, se você esperar, quando essa criança for mais velha, verá
que ela já se tornou uma ingrata difícil de mudar. O exemplo foi
colocado de propósito, porque é isso que muitas vezes experimentam
os pais que, por qualquer razão, abdicaram de educar os seus filhos:
o filho não mostra a menor gratidão a seus pais por terem lhe dado
a vida nem por e todos os esforços e sacrifícios que fizeram por
ele. Não há, neste caso, possível neutralidade, também não há
no que se aprende: ou Hitler foi um fenômeno que não desejamos, ou
as suas ideias são só mais uma opção possível.
A
fé católica tem algo importante para contribuir nessas
considerações. A verdade é que todos nós sabemos que fazer
o bem requer
esforço, enquanto que para fazer o mal basta se deixar levar. O
homem não é nem anjo, nem demônio, isso está claro. Mas, em sua
humanidade, tem uma certa deterioração, sem for impedido de fazer o
bem, muitas vezes se inclina para o mal. Isso é fácil de ver, mas
não de explicar. A explicação dada pela fé é chamada
de pecado original.
Não é um pecado no sentido usual da palavra, mas as consequências
negativas da rejeição hereditária que o homem fez a Deus no início
de sua existência (usando termos modernos, esse pecado consistiu em
querer total autonomia de Deus).
A
primeira razão para batizar uma criança é que o Batismo suprime
o pecado original. É verdade que não acaba com todas as suas
consequências, pois essa tendência para o mal persiste, mas o
Batismo as amortece e, abrindo a porta para a graça divina, faz com
que seja possível ter alguns meios eficazes para superá-lo.
Quando
se fala de adiar o Batismo até
uma idade em que a criança possa escolher, estamos implicitamente
incluindo a recusa de educar na fé, que é algo que se exige dos
pais como requisito indispensável. E já se mencionou aqui que a
neutralidade é utópica. Se os pais abrem mão de transmitir aos
filhos as suas convicções, acabam descobrindo que outros com menos
escrupulosos fizeram isso no seu lugar. Ninguém está em uma posição
neutra, livre de influências, e também as crianças precisam de
modelos humanos para seguir. Se elas não encontrarem em casa, vão
olhar para fora. Com essa atitude, o que os pais têm feito é deixar
a criança vulnerável a qualquer grupo ou ideologia religiosa,
alguns dos quais não são nada recomendados, por sinal.
Qualquer
pai e mãe não desnaturados buscam o melhor para seus filhos.
O Batismo faz
da pessoa que o recebe um filho de Deus e dá a graça – exceto
perante a rejeição voluntária –, que leva para o céu. Para
alguém com uma fé genuína, você não pode encontrar algo melhor
para dar à criança. Quando isso não for feito, os pais teriam que
ver se sua fé é realmente uma convicção, ou apenas uma mera
opinião, com pouco impacto em sua vida. Eles também devem ver se
sabem o que significa o Batismo, que é algo que vai muito além de
uma cerimônia de iniciação na Igreja.
Quase
tudo discutido aqui pode ser encontrado resumido no número 1.250 do
Catecismo da Igreja Católica, que se expressa nos seguintes termos:
"nascidas com uma natureza humana decaída e manchada pelo
pecado original, as crianças também têm necessidade do novo
nascimento no Batismo para serem libertas do poder das trevas e
transferidas para o domínio da liberdade dos filhos de Deus, a que
todos os homens são chamados. A pura gratuidade da graça da
salvação é particularmente manifesta no Baptismo das crianças.
Por isso, a Igreja e os pais privariam, a criança da graça
inestimável de se tornar filho de Deus, se não lhe conferissem o
Batismo pouco depois do seu nascimento".
Mas
a fé não deve ser acolhida livremente? Sim, claro, mas um simples
olhar para a realidade indica que o Batismo não
impede isso: a pessoa continua sendo livre para aceitar ou rejeitar a
fé. O Catecismo menciona a liberdade dos filhos de Deus, o que a
este propósito significa que o Batismo proporciona uma ajuda
sobrenatural para que as decisões estejam menos influenciadas pelas
consequências do pecado original – essa tendência a nos deixarmos
levar pelo que não é bom – com a qual todos viemos ao mundo.
Fonte: http://www.aleteia.org/pt/religiao